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Medicina Nuclear e o compromisso com a vida

Impulsionar a produção nacional de radiofármacos, ampliar a diversidade de fornecedores e reconhecer a importância dos profissionais que atuam na Medicina Nuclear são medidas para aumentar o acesso e melhorar o cuidado de milhões de pacientes no Brasil.

Por: Dr. Paulo Almeida – Vice-Presidente da SBMN

A Medicina Nuclear utiliza substâncias radioativas medicamentosas (radiofármacos) para realizar diagnóstico e tratamento de diversas doenças graves e raras. A Medicina Nuclear está, atualmente, na linha de frente do combate ao câncer — tanto no diagnóstico quanto na terapia. No Brasil, existem cerca de 450 serviços dedicados à especialidade, que atendem milhares de pacientes anualmente. No cenário internacional, trata-se de uma das áreas que mais crescem. 

Nesta semana, o país acompanhou com temor a interrupção na entrega de geradores de Tecnécio-99m, utilizado na maioria dos exames diagnósticos da Medicina Nuclear. Também foi suspensa a distribuição de Iodo-131 e Lutécio-177, fundamentais para terapias oncológicas. A causa foi um ataque cibernético ao Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), parceiro histórico e estratégico no desenvolvimento da Medicina Nuclear. A ocorrência impactou diretamente o funcionamento de todos os serviços de Medicina Nuclear no Brasil, resultando em mais de 40 mil pacientes por semana sem atendimento, acendendo um alerta sobre a vulnerabilidade do atendimento dos pacientes que dependem desses procedimentos.

A Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear e Imagem Molecular (SBMN) considera urgente o debate para aumento da aplicação de verbas públicas em infraestrutura e recursos humanos no IPEN e na CNEN (Comissão Nacional de Energia Nuclear) através do reinvestimento dos recursos gerados pelo próprio IPEN, de forma a evitar que novas falhas operacionais ocorram e comprometam o acesso dos serviços de Medicina Nuclear e da população brasileira aos importantes procedimentos diagnósticos e terapêuticos que utilizam radiofármacos. Falhas operacionais não podem comprometer o acesso a tecnologias vitais. 

Ao mesmo tempo, a SBMN reconhece e valoriza a dedicação e resiliência dos profissionais técnicos e administrativos do IPEN, que, diante de adversidades complexas, vêm trabalhando para restabelecer os serviços com segurança, eficiência e responsabilidade.

A Medicina Nuclear brasileira convive há anos com dificuldades crônicas na produção e distribuição de radiofármacos. Atualmente, todo o sistema está centralizado em um único fornecedor com capacidade de atendimento nacional: o IPEN. Apesar de ser uma instituição estatal de excelência técnica, o órgão enfrenta, a cada momento, exigências da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) que dificultam o fornecimento (antes rotineiramente realizado) do arsenal de radiofármacos necessários para a Medicina Nuclear. Isso ocorre, em grande parte, pela ausência de investimentos que permitam ao IPEN adequar-se às normas do órgão regulador. Além disso, como qualquer instituição produtora, o IPEN está sujeito a falhas em diferentes etapas de sua cadeia produtiva.

O maior desafio é atender à demanda em escala nacional e por preços competitivos. Atualmente, o único gerador de tecnécio-99m, autorizado pela ANVISA (além dos importados pelo IPEN) e ofertado por uma empresa privada, pratica preços inviáveis tanto para o Sistema Único de Saúde (SUS) quanto para a saúde suplementar, principalmente em razão da alta carga tributária e das variações cambiais. O processo de importação ainda é burocrático e lento. 

A situação do Iodo-131 é ainda mais crítica, pois o país não conta com fornecedores estrangeiros que exportam regularmente essa substância. O episódio recente ilustra com clareza a fragilidade que acomete a Medicina Nuclear no Brasil.

Aprimorar a integração com os órgãos reguladores e estabelecer um planejamento sólido para o fornecimento contínuo de radiofármacos são medidas urgentes. Da mesma forma, abrir o mercado, facilitando a entrada de novos fornecedores e tornando o ambiente regulatório mais atrativo — como já ocorre em diversos países — daria um impulso significativo à área.

No entanto, essas ações precisam ser conduzidas com espírito propositivo e visão estratégica. Para a SBMN, o caminho passa pela cooperação institucional, pela transparência nos processos e pela construção conjunta de soluções com os órgãos competentes. Valorizar a cadeia produtiva nacional, atrair fornecedores internacionais, investir em infraestrutura e viabilizar recursos orçamentários permanentes são pilares para preservar a autonomia e a continuidade da Medicina Nuclear no Brasil. É imprescindível que as políticas públicas reconheçam o papel central dessa especialidade no diagnóstico precoce e no tratamento adequado de milhares de brasileiros.

A Medicina Nuclear é indispensável no enfrentamento de diversas doenças, como o câncer, mas ainda enfrenta obstáculos no país. A recente interrupção na distribuição de radiofármacos, causada por um ataque cibernético ao IPEN, escancarou a dependência de um único fornecedor estatal e os entraves relacionados à burocracia, aos altos custos e à falta de investimentos. Diante disso, a SBMN defende a diversificação dos fornecedores, a modernização da regulação e a ampliação dos aportes financeiros, de modo a fortalecer a produção nacional e assegurar um atendimento contínuo e de qualidade à população brasileira.

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